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Foto do escritorLeo Gudel

CONTRATADO PARA MATAR

Atualizado: 31 de jan.

Muitos diretores de cinema e televisão lutam ou sonham em fazer projetos autorais. Eu não. Eu gostava de ser contratado. Só o fato de ter alguém pagando pelo projeto já é maravilhoso, mas o que eu gostava de verdade era explorar universos desconhecidos.


Verdade que acabei fazendo muitos projetos do gênero policial, mas mesmo eles eram mundos bem distintos. Uma delegacia de polícia nos anos 90 em Copacabana, onde o escritório do delegado era no bar em frente, é bem diferente do universo de um miliciano no subúrbio do Rio, que faz justiça com as próprias mãos, e com isso acaba matando o próprio filho. A 12a DP em Copacabana nos anos 90 merece um post só para ela. O delegado recebia os policias e as vítimas bebendo cerveja! Ele ligava e atendia o telefone do bar! O vestiário dos policiais era em um termas! Surreal? Nada. Isso é Copacabana. Kkkkkkk


Em seguida, tive a sorte de mergulhar no universo mágico do Antônio Nóbrega e seus estudos sobre a cultura popular brasileira. As músicas, o vocabulário dos movimentos das danças regionais, os mitos, as lendas (também merece um post). Sou tão sortudo, que acabei parando dentro da Sociedade Alternativa com Raul Seixas, Paulo Coelho e toda magia, rebeldia do Rock dos anos 70.


Foram momentos mais do que prazerosos, foram experiências extasiantes. Acho que poucos vão poder ter oportunidades parecidas.


Um desses momentos foi quando o diretor Leonel Vieira, de Portugal, me convidou para escrever um roteiro. Ele não tinha uma história, só sabia que queria um filme que tivesse jogo do bicho, tráfico de drogas nas favelas e que o protagonista fosse norte americano, para vender melhor no mercado internacional. Isso foi em 2009, antes do Netflix quebrar a barreira dos filmes não falados em inglês.


A primeira coisa que me perguntei foi: o que é que o jogo do bicho tem a ver com o tráfico? Na época, estava terminando de escrever o livro Sangue Azul, o relato de um Policial Militar. Fui até a casa dele e fiz a mesma pergunta. Ele não soube responder. Só sabia que todos os seguranças dos bicheiro ou eram Policiais Militares ou Policiais Civis. "Tanto que depois da morte do Castor de Andrade, os herdeiros entraram em guerra e era Civil atirando em PM.", ele me disse.


Na época não existia acervo digital, então fui nos acervos dos jornais e revistas até encontrar o acervo da revista Veja. Mais uma vez, dei muita sorte. Eles tinham pastas com as matérias organizadas por tema e ano. Sentei alguns dias lá na sala de pesquisa e li tudo o que saiu sobre o jogo do bicho do início dos anos 60 até o fim dos 90.


Li sobre as mortes de diversos bicheiros nos anos 70. Foi uma verdadeira chacina, dezenas de mortes. Sobre a criação da LIESA, a Liga Independente das Escolas de Samba. No meio disso, vez ou outra, aparecia uma reportagem estranha. Essa, por exemplo, foi na coluna de fofocas: "Pablo Escobar visita casa de Castor de Andrade em Angra dos Reis". Aliás, os bicheiros apareciam muito nas Colunas Sociais, principalmente por causa do Carnaval.


A sorte mais uma vez sorriu para mim. O Marcello Maia, grande produtor de cinema, tinha feito um trabalho com a Juíza Denise Frossard e me passou o contato. Ela me recebeu na mesma semana. Uma pessoa sensacional. Sentado na sofá da sala dela, ouvido as histórias de tudo o que ela passou, eu só conseguia pensar: "quando crescer eu quero ser igual a ela. Que mulher foda!"


Como a maioria das pessoas já sabem, talvez os mais jovens não, ela foi a pessoa, mulher nos anos 90, que prendeu toda a cúpula do jogo do bicho. Não sei se dá para entender o peso desse ato. Ela prendeu todos os chefes do crime organizado da época. Como se tivesse prendido todos daquela reunião de mafiosos do filme o Poderoso Chefão. Obviamente, o estado provia seguranças 24h, eram Policiais Civis. Como explicado anteriormente, difícil essa segurança dar certo. Um deles foi Contratado Para Matar (olha o título do post aí gente rs) a juíza. Ela escapou de 3 atentados.


Eu estava trabalhando para o Ruy Guerra em um projeto chamado O Último Gato. Contei isso para o diretor do filme e apesar dos meus protestos, o Leonel chamou o filme de o Último Animal. Desculpa Ruy.

O filme O Último Animal estreou ano passado na Europa e deve estrear esse ano aqui no Brasil. Acabei não fazendo parte do roteiro final, mas me deram um crédito, "baseado no roteiro de Leonardo Gudel e Leonel Viera".


Na verdade, escrevi este post porque ontem, recebi da Juíza Denise Frossarda, por Whats uma matéria incrível, que abriu os meu olhos. E todas essas experiências que contei também abriram meu olhos para um Rio de Janeiro que a gente faz questão de fingir que não existe. Segue a matéria escrita por Leo Aversa do Jornal O Globo:




Ela mandou a matéria e escreveu: No alvo 🎯




162 visualizações2 comentários

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2 Comments


Zecapassos
Jan 27

Acredito que esse foi um dos "casos" que mais chamou a atenção do público, brilhantemente "destrinchado" pela Juíza Dra Denise Frossard, mas eu bem conheço outro, de grande relevância. Graças a Deus, temos alguém tão honesta e gabaritadíssima!

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Leo Gudel
Leo Gudel
Jan 28
Replying to

Opa Zeca. Muito legal você compartilhar com a gente. Incrível! Ela realmente é fantástica! Seria uma alegria muito grande se pudesse contar um pouco mais.

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